quinta-feira, 24 de julho de 2014

"Rá-Tim-Bum", nostalgia e hipocrisia



As filas que dobram quarteirão em volta do Museu da Imagem e do Som (MIS) aqui em São Paulo, onde está a exposição sobre o "Castelo Rá-Tim-Bum", são um caminho que me leva a duas reflexões. Primeira: não é verdade que o brasileiro é avesso à arte e à cultura, como apregoa o senso comum vira-lata. E segunda: trata-se de uma nostalgia que, por um lado, é bela, mas por outro beira à hipocrisia.

Explico. 

O "Castelo Rá-Tim-Bum" foi um programa infantil educativo de uma TV Cultura que caminhava para ser, guardadas todas as devidas proporções, um tipo de BBC tupiniquim: pública sem ser política-partidária, educativa sem ser chata e criativa, acima de tudo. 

Essa Cultura produziu programas brilhantes, como o próprio "Castelo" ou o "Rá-Tim-Bum", que o antecedeu, ou ainda o "Mundo da Lua", também para o universo infantil. Para jovens, havia, por exemplo, o "Matéria Prima", com um Serginho Groismann que fazia coisas muito melhores que apenas lamber globais. Para adultos, havia telejornais investigativos como o "60 Minutos", programas de debate de alto nível como o "Roda Viva", uma grade cultural diversificada e muito bem trabalhada no "Metropolis", entre outros tantos exemplos.

Acontece que essa TV Cultura está morta e o mesmo público que abarrota o MIS para quase chorar de emoção com os figurinos e cenários do "Castelo Rá-Tim-Bum" nada faz no sentido de reivindicar a volta de uma grade de qualidade na telinha mágica de uma emissora bancada com nossos impostos. Muito pelo contrário: apesar do excelente padrão que tinha, a Cultura nunca esteve nem perto de uma boa audiência (a Xuxa sempre foi muito mais querida no Ibope que a bruxa Morgana).

O que temos de programação infantil, hoje, na TV aberta é um esgoto fétido que mistura apelo ao consumismo e à erotização precoce, além da violência banalizada em desenhos animados que muitas vezes se parecem com filmes de terror. Ou seja, não ficou sequer um legado do "Castelo Rá-Tim-Bum" na TV brasileira e nisso todos temos culpa, afinal, antes de tudo, a Cultura é uma emissora pública e mesmo nas outras (comerciais) temos o direito e a possibilidade de influenciar na programação, desde que nos engajemos.

Sintonizar a TV Cultura, hoje, é quase entrar num museu televisivo: reprises, reprises e mais reprises. Quando não, é um palanque político que a emissora se transformou, a serviço do partido que governa o Estado há duas décadas, quase uma dinastia que parece não ter fim. O "Roda Viva" virou sucursal da revista "Veja" e todos os diretores geniais que criavam coisas como o "Castelo" -e tinham projetos brilhantes para sucedê-lo- nem têm mais cargo na emissora que só corta investimentos e não mantém nenhum projeto de futuro.

Nada contra os que estão na fila para ver os personagens do "Castelo" no MIS. Eu mesmo quero logo me somar a ela. Mas penso que poderíamos ir além e aproveitar essa nostalgia para refletir e agir sobre qual TV queremos ter em nossas salas, fazendo a cabeça de crianças, jovens e adultos. 

foto: Divulgação

quarta-feira, 9 de julho de 2014

E agora, Kajuru?

É fácil gritar palavras de ordem quando se tem um microfone aberto e um canal de TV disposto a gerar polêmica sem nenhum compromisso com a verdade. 

Jorge Kajuru, um comentarista que reflete muito bem o péssimo nível do jornalismo brasileiro (que prefere discursos inflamados e cheios de achismos aos fatos), afirmou meses antes da Copa que o Brasil ganharia o Mundial porque estava tudo comprado. Ele chegou a dizer que encerraria sua carreira caso isso não acontecesse. Veja no vídeo aí embaixo.


Pois o Brasil não venceu e provou-se que nada estava comprado. Pergunto: Kajuru vai cumprir a promessa de nos deixar livres de seus comentários dantescos? Mais que isso: vai ser responsabilizado pela grave acusação que fez? Ou será mais uma prova de que grande parte da corrupção e da impunidade deste país mora na imprensa, que sequestra e violenta a verdade em muitas de suas manchetes, permanecendo impune após publicar tanta barbaridade? 

Apenas lembrando um caso emblemático, que nada tem a ver com esporte ou Copa, mas tem tudo a ver com uma mídia irresponsável: o crime noticioso da Escola Base destruiu uma família e nenhum (nenhum!) jornalista foi responsabilizado por publicar denúncias falsas de abuso sexual numa escola infantil. Apenas multinhas que se arrastam nos tribunais foram impostas a gigantescos veículos de comunicação. O casal que era dono da escola já morreu, enquanto as multas apodrecem nas gavetas da Justiça. E a mídia continua gerando novas vítimas, dizendo que isso é "liberdade de expressão".

terça-feira, 8 de julho de 2014

Faltou verdade


O que mais nos faltou desde as vésperas desta Copa foi verdade. Aliás, esta é uma Copa que, há uns cinco anos, é vítima de um festival de mentiras. Começou fora de campo, com as previsões catastróficas sobre aeroportos, estádios, protestos, atos terroristas e afins, e hoje se escancarou dentro do gramado.

A verdade é que nunca tivemos uma grande seleção, capaz de conquistar o hexa e de fazer bonito em casa. E isso não quer dizer que temos o direito de ofender jogadores, avacalhar o técnico ou queimar bandeiras. Perdemos porque merecemos perder e porque no futebol alguém ganha e alguém perde -e, no geral, vence o melhor (hoje, indiscutivelmente a Alemanha).

Fomos vítimas de uma indústria que, por um lado, nos assustou dizendo até que o PCC agiria nas ruas matando pessoas e, por outro, nos enfiou goela abaixo um time de heróis invencíveis retocados em photoshop e ilustrados em outdoors, em caixas de cueca, em embalagem de sorvete, em gôndolas de supermercados. Nas narrações e nas mesas redondas, mais se torceu do que se analisou e os mesmos que começaram a cobertura do jogo derradeiro apostando na vitória do Brasil (como se tivesse o poder de prever) acabaram cravando críticas ferrenhas contra "o maior vexame da história", indo do ufanismo bobo ao "mimimi" infantil.

A primeira verdade que faltou é que a Copa que o jornalismo alardeou como um retumbante vexame é um sucesso -e quem reconhece isso é o mundo. A segunda é que a seleção que a publicidade e o jornalismo publicitário pintaram como um plantel de heróis é formada por um grupo de jogadores que ainda têm muito a aprender - e que não merecem nem ser exaltados, tampouco execrados, pois deram o que podiam dar.

Não tenho vergonha nenhuma de todos os gritos de gol que dei pela seleção do meu país, nem jamais usarei qualquer palavra ofensiva a qualquer jogador ou membro da comissão técnica. E tenho orgulho pela Copa que o Brasil está fazendo, certamente um acontecimento inesquecível que contribui para mostrar ao mundo nossa alegria, nossa diversidade, nossa hospitalidade e nossa competência em abrigar o maior evento do planeta.

Encaremos a verdade que não está no noticiário nem na propaganda, porque só a verdade nos liberta de dois dos piores defeitos humanos: a alienação e a hipocrisia. 

Foto: Agência Brasil

sexta-feira, 4 de julho de 2014

David Luiz, um brasileiro



Disseram que daríamos vexame em todos os sentidos, nos estádios, nos aeroportos, nas ruas, mas não demos. Muito pelo contrário, mostramos a todos que podemos, sim, sediar o maior evento do planeta em 12 (doze!) capitais do nosso país, do concreto de São Paulo à Floresta Amazônica. Mais que isso, mostramos que podemos encantar com nossa hospitalidade, com nossa alegria, com nossa criatividade e até com nosso jeitinho quando ele não é sinônimo de malandragem, mas de jogo de cintura.

Entretanto, entre xingamentos e vaias de uma elite intolerante, faltava surgir uma atitude que demonstrasse o que temos de melhor, encarnada em um pequeno gesto de um atleta chamado David Luiz. Distante dos holofotes das estrelas do futebol-publicidade, ele acabou eleito o melhor jogador da Copa até as quartas-de-final e, nesta sexta, 4 de julho, poderia ser eleito o melhor ser humano do evento, um brasileiro digno de representar o Brasil e quem sabe um mundo capaz de enxergar a vitória não como um placar ou uma taça de ouro, mas como resultado de atitudes dignas, acima das disputas.

Enquanto todos comemoravam a vitória do Brasil sobre a Colômbia, David Luiz se aproximou do inconsolável James Rodriguez, o craque adversário cuja vida pessoal e profissional é sinônimo de superação. Abraçou-o e, apontando para ele, pediu ao público que o aplaudisse, em reverência ao seu talento, à sua luta, ao reconhecimento que ele merece independente do resultado do jogo e do fato de fazer parte do time rival. Enquanto James chorava, David lhe mostrava que a vitória não está apenas em ser o melhor no placar, mas em lutar constantemente diante de todos os desafios que a vida nos impõe.

Neymar, o garoto com alma de gingante, fraturou uma vértebra, vem aí a perigosa Alemanha e tem a Argentina no páreo. Mas tudo isso é apenas questão de competição. Nós já vencemos a Copa. Vencemos o terrorismo da mídia, vencemos o complexo de vira-latas que Nelson Rodrigues descreveu tão bem e vencemos o desafio de provar que somos, sim, um país com os mais nobres valores.

David Luiz, um brasileiro que tem orgulho de seus cabelos cacheados, deu uma aula do que é o "fair play". Mais que isso: ele mostrou ao planeta como é o Brasil dos brasileiros que labutam de sol a sol, com dignidade e respeito a todos os adversários que surgem pela frente. 

A atitude deste atleta representa a mim e a você. E a todos os que acreditam que o melhor não é aquele que se sobrepõe ao outro, mas quem tem a grandeza de reconhecer que tudo está conectado. É a evidência de que não precisamos dos melhores do mundo; precisamos, sim, dos melhores para o mundo.

(Foto: Agência Brasil)

terça-feira, 1 de julho de 2014

Recorde a mídia terrorista pré-Copa



Se recordar é viver, como afirma o ditado popular, lembrar um pouco do que a velha mídia publicou sobre como seria a Copa do Mundo no Brasil, às vésperas do evento, é ter medo de morrer.

Caos aéreo, estádios sem condições de funcionar, metrô e trânsito abarrotados, apagão energético, protestos mortais num conluio entre black blocs e o PCC e até o próprio terrorismo foram alardeados como perigos reais pelos jornalões, revistas e TVs.

Pois o evento chega às quartas de final já tido como o melhor Mundial de futebol do planeta e da história. O Brasil mostrou que não só é capaz de fazer uma Copa como pode fazê-la encantadora, porque seu povo é encantador, bem diferente de suas mídia, podre e mentirosa.

Abaixo, estão algumas das capas de jornais e revistas dos grupos Folha, Abril, Estado e Globo. Esses veículos ditos jornalísticos deveriam se envergonhar do que fizeram, mas sequer tiveram caráter para pedir desculpas pelo festival de mentiras que estamparam em suas manchetes.



A Folha põe organização em xeque no dia da abertura


A Época, da Globo, traz para a Copa do Brasil ato terrorista praticado em Boston

O Estadão anuncia uma união entre black blocs e PCC para matar torcedores pelas ruas


Na CBN, da Globo, Jabor garante que a Copa escancararia a incompetência do Brasil
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Black blocs, greves, tumultos, terrorismo, crime organizado nas previsões da Veja
Veja usa "cálculos matemáticos" e prevê estádios prontos só para 2038


Folha prevê o caos aéreo

No Globo, atrasos

Na Época, da Globo, a ideia de que tudo no Brasil é puro atraso


LEIA +
Sobre o "vai tomar no c*" da abertura e as vaias ao hino chileno, clicando abaixo para ler: