segunda-feira, 7 de abril de 2014

Jornalistas, comemoremos o amanhã



"Sou jornalista, mas gosto mesmo é de marcenaria. Gosto de fazer móveis, cadeiras, e minha ética como marceneiro é igual à minha ética como jornalista - não tenho duas". São palavras de Claudio Abramo, escritas no livro "A Regra do Jogo" e que permitem uma boa reflexão para o dia de hoje, quando se celebra o profissional do jornalismo. 

Abramo nasceu em 1923 e este seu texto é um importante lembrete de que um repórter, um editor ou até mesmo o mais poderoso profissional de um veículo de mídia deveria ser apenas servo dos fatos, não estando, em hipótese alguma, acima deles. "Não existe uma ética específica do jornalista: sua ética é a mesma do cidadão. Suponho que não se vai esperar que, pelo fato de ser jornalista, o sujeito possa bater a carteira e não ir para a cadeia", escreve Abramo.


A comparação com um batedor de carteiras pode parecer exagerada, mas é bem pertinente, porque quando se distorce um fato, quando se descontextualiza uma frase dita por uma fonte ou personagem entrevistado, quando se carrega nas tintas com o objetivo de agredir ou enaltecer, se está, na verdade, roubando algo que é de direito de todos em uma democracia: a informação ou, como diria Mino Carta, o acesso à "verdade factual". 

A mídia brasileira está repleta de batedores de carteiras, de ladrões da verdades, de gente que se acha dona de uma ética muito acima da ética do "resto" da população. Arrogância, distorções, sensacionalismo, erros crassos sem a devida correção, engajamento político e econômico e até um certo terrorismo informativo são alguns dos vícios que maculam a imprensa. Isso é, em grande parte, de responsabilidade dos donos, dos patrões, que em geral não são jornalistas e pouco entendem de jornalismo, querendo usar seu jornal, sua revista ou sua TV para exercer poder. Entretanto, eles só conseguem levar isso a cabo porque contam com a conivência de jornalistas, que se prestam a um papel de capacho, de capataz.

Felizmente, porém, a comunicação está plena revolução, na transição do analógico centralizado para o digital distribuído e compartilhado. Todos ganharam poder de mídia com a internet 2.0, com seus perfis nas mídias sociais e isso já exige a construção de um novo tipo de jornalismo e de um novo tipo de jornalista. O novo profissional precisa ser aberto à interação, como mediador da sociedade e não mais porta-voz de quem lhe paga o salário ou patrocina a publicação para a qual escreve. A fórmula da comunicação está mudando. Não há mais emissores e receptores, mas uma sinfonia comunicativa em que todos são receptores e emissores.

O velho jornalismo, agonizante nas ditatoriais folhas impressas ou nas apelações bizarras da TV aberta, terá de morrer para renascer uma nova comunicação, em que o jornalista vai precisar, sim, aprender a ser marceneiro, servindo à verdade, à democracia e ao bem comum. Ou morrerá junto com o papel e o televisor de válvula.

Se há algo a comemorar, portanto, certamente está na possibilidade do amanhã. Hoje, o jornalismo (e isso não é só no Brasil) faz muito menos do que poderia fazer por um mundo melhor.

(foto: BrAt82/Schuterstock)

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